A importância do sequestro de carbono no combate ao aquecimento global
Mudanças climáticas, cada vez mais intensas, afetam na alimentação, na segurança energética, alimentar e em outras áreas do corpo social.
Especialista afirma que, caso essas medidas de sequestro de carbono e de redução de gases não sejam realizadas, o meio urbano é quem mais sofrerá. (Foto: Unsplash)
O aquecimento global está ligando o alerta por conta dos recordes preocupantes de impactos climáticos globais, influenciado pelo aumento de emissão de gases de efeito estufa (GEE). Atividades antrópicas, como a queima de combustíveis fósseis ou o desmatamento, possibilitam o acúmulo de dióxido de carbono (CO2 ou gás carbônico) na atmosfera — um dos GEE mais importantes — e isso intensifica essa problemática.
Assim, na Conferência de Quioto de 1997, foi criado o conceito de sequestro de carbono, o qual seria uma tecnologia que possui o objetivo de retirar o gás carbônico da atmosfera e armazená-lo na terra — também pode ser feito de maneira natural. O professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo e coordenador do CCARBON (Centro de Estudos de Carbono em Agricultura Tropical), Carlos Eduardo Cerri, explica que existem três maneiras de ocorrer essa captura.
Como é realizado
Uma das formas de realizar essa retirada é de maneira artificial, a partir do uso de bombas que filtram especificamente o CO2 no momento que ainda estão nas chaminés, enquanto os outros gases são lançados à atmosfera. Esse gás capturado é bombeado e armazenado em cavidades rochosas por séculos e, por isso, é chamado também de sequestro geológico (em inglês — Carbon Capture Storage) — mas o especialista ressalta que o processo é custoso, cerca de US$ 200 por tonelada, e por isso não é tão utilizado.
Outra forma, porém gratuita, é feita por meio das plantas: “Durante a fotossíntese, as plantas retiram CO2 da atmosfera e esse carbono, que estava na forma gasosa, agora dentro da planta, está na forma de compostos bioquímicos”, desenvolve o docente. Ele conta que, dependendo da planta, ela pode viver por décadas e, durante todo esse período, estará auxiliando no processo de captura e armazenamento do gás.
Esse meio é o mais comum, uma vez que é realizado naturalmente pelas florestas, especialmente no momento em que estão se desenvolvendo, e ajudam a diminuir a concentração de gás carbônico consideravelmente. Para além das árvores, o sequestro de carbono natural ocorre nos oceanos também, nos processos de calcificação de organismos marinhos, no entanto, o excesso do gás promove a acidificação das águas.
O terceiro método citado por Cerri é o que ocorre nos solos, onde, após a captura do dióxido de carbono pela planta, as raízes localizadas no subterrâneo sofrem decomposição por organismos — como fungos, bactérias e outros não vistos a olho nu. “Esse carbono, agora presente no solo, fica na forma de uma série de compostos orgânicos, responsáveis por melhorar as propriedades físicas e químicas do solo”; ele completa que, caso bem trabalhado pelos organismos, o gás pode permanecer por milênios na terra.
Crédito de carbono
Apesar do meio de retirada mais comum e efetivo ser gratuito, do ponto de vista tecnológico, existe um custo para manutenção dessa área preservada, seja para compra de fertilizantes, água ou até mesmo energia. Diante disso, existe um mercado de carbono, no qual o crédito de carbono é a moeda comprada por empresas com alto nível de emissão de GEE e pouca opção de redução do mesmo, para compensar esse lançamento.
“Não estou considerando o desmatamento ilegal, porque isso é crime, mas, legalmente, o indivíduo teria direito a desmatar uma parte da área, mas ele opta por não o fazer”, explica. Assim, é possível fazer uma quantificação do carbono existente nessa área protegida e o proprietário faz um contrato com a empresa para vender esses créditos, comprometendo-se a não desmatar esse local por um determinado período.
Entretanto, ele alerta que só é possível receber esses créditos nas localidades adicionais ao que é previsto na lei, segundo o Código Florestal: “Vamos supor que seja um Cerrado, 50% ele pode desmatar e 50% tem que manter. Então, considerando que ele tenha 70% da área preservada, ele pode requerer os créditos por apenas esses 20% que tem a mais”.
“Eu acho que o líder mundial para sequestro de carbono, em área de agricultura, pecuária e florestas, dentre todos os países, é o Brasil. É o ‘player’ com maior potencial”; contudo, ele complementa que o País não tem explorado todo esse potencial por uma série de entraves de caráter jurídico, econômico, técnico e cultural. A ausência de um aparato para mensurar as emissões que leve em conta a diversidade das propriedades rurais e a falta de regulamentação são alguns desses obstáculos, além disso, deve existir um foco na restauração ecológica e na proteção da biodiversidade.
Cerri compara com a realidade de outras nações, como o Japão ou a Holanda, que possuem um território de pequena extensão e, por conta disso, não conseguem adotar práticas que façam impacto. Por outro lado, ele também cita a China, um país de área maior que o Brasil, mas que não se compromete com essas medidas, uma vez que prefere manter sua matriz energética baseada nos combustíveis fósseis — por questões mercadológicas.
“Enquanto a queima de combustível fóssil é a vilã da história e não tem como sequestrar carbono nessa mesma dimensão, a agricultura, a pecuária e a silvicultura, se bem conduzidas, são parte da solução, não do problema. Por isso, dentro do panorama global, o Brasil tem plenas condições de alavancar muitas iniciativas”, enfatiza. Isso ocorre devido ao País possuir expertise em matriz energética limpa, em captura de carbono pela flora e, também, em agricultura regenerativa.
Realidade x expectativa
USP lidera pesquisas de novos combustíveis para transição energética sustentável
O especialista afirma que, caso essas medidas de sequestro de carbono e de redução de gases não sejam realizadas, o meio urbano é quem mais sofrerá: “O aquecimento global vai ficando cada vez mais intenso, as pessoas ficam cada vez mais desconfortáveis, mais eventos climáticos são alterados e têm eventos extremos”.
Ele ressalta que o impacto é direto e, dessa forma, as mudanças climáticas, cada vez mais intensas, afetam na alimentação, na segurança energética, alimentar e em outras áreas do corpo social.
Nesse âmbito, durante a COP28 — evento no qual o Jornal da USP realizou uma cobertura completa —, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, considerou o momento como um “colapso ambiental” e destacou a urgência na ação das nações. No ano de 2023, foi registrado o recorde na queima de combustíveis fósseis (36,8 bilhões de toneladas) e, ainda assim, os países responsáveis por 73% das fontes de emissões de gases de efeito estufa não se mostraram dispostos a negociar a redução dessa prática.