Pedro Reis, ministro da economia de Portugal: 'o melhor que o Estado pode fazer é deixar as empresas respirarem e crescerem'
O ministro da economia de Portugal, Pedro Reis, apresentou dados exclusivos. Ele participou do evento ao lado de outras autoridades portuguesas e empresários de ambos países.
Pedro Reis, ministro da economia de Portugal. (Foto: Kym Willer/LIDE)
Em sua segunda vez na capital portuguesa, o LIDE Brasil Conferência Lisboa reuniu os principais nomes dos setores de economia, finanças, tecnologia e investimentos na manhã desta sexta-feira (15), no Ritz Four Seasons Hotel. A ideia do encontro, que é uma iniciativa do LIDE - Grupo de Líderes Empresariais, Folha de S. Paulo e UOL, foi trazer à tona as principais discussões sobre o impacto da Inteligência Artificial nos governos e sistemas financeiros, open finance, moedas digitais e oportunidades de investimento entre as duas nações.
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Marcelo Salomão, chairman do LIDE Portugal desde sua inauguração, relembrou durante suas boas-vindas o antigo relacionamento dos dois países e as perspectivas para o futuro: “Brasil e Portugal têm uma história antiga, o que nos faz pular etapas e falar com franqueza sobre todos os assuntos que coloquem as empresas dos dois países na melhora do mundo".
Ainda na abertura, foi destacado o papel das discussões feitas durante os eventos do LIDE para a mudança nos caminhos do país, salientando a aprovação recente do PL 182/2024 pelo Senado Federal, que cria o mercado de carbono regulado no Brasil, por meio do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), encaminhado à Câmara para apreciação. O tema foi assunto de um dos paineis apresentados no LIDE Brazil Conference Londres, há duas semanas.
Inovação e tecnologia
Dando início ao painel, Carlos Affonso Souza, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS), trouxe provocações sobre o impacto da IA e das redes sociais nas eleições americanas, nas movimentações econômicas da China e nas primeiras legislações sobre a IA na Europa.
Mas para onde vai o Brasil nesse cenário? O Congresso Nacional, segundo ele, precisa ter uma regulação abrangente de IA e mencionou o PL 2.338/2023, que busca regular a atividade no Brasil. Souza também convidou os empresários e demais autoridades a se engajar nessas discussões, a fim de que o Brasil crie uma solução que olhe para as demandas e peculiaridades do país, levando em conta também as melhores práticas internacionais.
“Vamos viver um período de intensas discussões sobre IA nos próximos cinco anos, algo como uma corrida para a predominância na discussão sobre a Inteligência Artificial e seu desenvolvimento”, afirmou. “A IA é uma infraestrutura que alimenta diferentes setores e o Brasil não pode ficar a ver navios".
Tom Petreca, diretor da Tencent para a América Latina, empresa líder global em inovação e patentes e IA, abordou em sua exposição o desenvolvimento de soluções em IA generativa e algoritmos, bem como seu impacto de larga escala nos governos e sociedade.
Alguns dos setores que podem se beneficiar desse tipo de inovação com responsabilidade são o transporte, o turismo, a acessibilidade, a segurança, meios de pagamento, a saúde pública e o acesso a serviços públicos mais burocráticos, de forma eficiente, agregando valor aos setores públicos e privados. "A IA é um meio para respostas que antes exigiam muito mais esforço”.
Breno Silva, presidente do LIDE UK, e global partner da startup Bootcamp, que é a terceira maior aceleradora de tecnologia emergentes no mundo, incluindo a Inteligência Artificial, gerenciando mais de 30 ecossistemas de inovação mundo afora, falou em seguida. O Brasil, segundo ele, precisa se inspirar em Portugal, que é uma referência na inovação mundial, atraindo crescimento, investimento e novos negócios, gerando valor para a sociedade.
“A inovação não pode acontecer em isolamento. A gente precisa muito da participação das empresas e dos governos nesse processo, para que a regulamentação do setor aconteça de forma eficiente, a fim de atrair novos negócios e não impedir que eles aconteçam", apontou. “O Brasil tem tudo para ser líder na área da tecnologia e inovação e o país precisa olhar para a educação de qualidade com mais carinho. Somente pela educação é que o país vai alcançar esse espaço na inovação".
Economia e finanças
Sandra Utsumi, diretora executiva do Haitong Bank, deu início ao segundo painel do dia “Nova Era Bancária: benefícios e aplicações do open finance, das moedas digitais e dos serviços eletrônicos no sistema". Em sua exposição, ela trouxe grandes pontos de contato entre a tecnologia e a bancarização no Brasil e em Portugal, trazendo oportunidades de crescimento e expansão da bancarização da população. Embora o país latino-americano tenha sido pioneiro na inovação e digitalização dos serviços bancários, facilitando transferências com o PIX, uso de tokens e criação de produtos digitais, a colaboração entre os dois países pode trazer ganhos importantes para os consumidores.
“O Brasil, entre os emergentes, é um dos países mais bancarizados do mundo, com cerca de 86% da sua população incluída no setor bancário; em Portugal, são 95%. Ainda há muito espaço para inovação e inclusão financeira", explicou.
O Presidente da Febraban, Isaac Sidney, relembrou os principais episódios marcantes na trajetória dos bancos brasileiros, que apesar de difíceis, foram importantes para forjar a solidez e a resiliência das instituições nacionais. Plano Real, crise econômica mundial de 2008 e a pandemia de COVID-19, segundo ele, foram provas de fogo que permitiram alavancar o setor bancário, com grandes aprendizados e inovações.
"Hoje, 80% das operações bancárias no Brasil ocorrem nos canais digitais", destacou. "Nós carregamos nos bolsos dos nossos próprios bancos. E o open finance permite que os consumidores possam ter controle sobre suas opções".
Sidney explicou ainda que o DREX, moeda digital do Banco Central, poderá ampliar o acesso ao crédito, integrar contratos e permitir que a moeda brasileira seja parte importante da economia global.Para manter esse crescimento, é preciso ter equilíbrio macroeconômico e das contas públicas, com juros baixos, a fim de atrair investimentos internacionais.
“A direção do Brasil está correta, mas precisamos imprimir um ritmo bem mais forte na contenção dos gastos públicos. E tempo é ouro", finalizou.
Paulo Henrique Costa, presidente do Banco BRB, relembrou a discussão sobre o open finance na última conferência do LIDE, em Londres e levantou dados importantes para dar dimensão sobre o tamanho do mercado brasileiro: mais de 160 milhões de usuários já fizeram ou já receberam um PIX, com a internet chegando a 92,5% dos lares brasileiros.
O open finance trouxe novos produtos, serviços e melhorias na experiência do cliente e mais de 155 milhões de brasileiros já são usuários desse sistema, que tem um papel-chave de inclusão no sistema financeiro. Ele permite que os consumidores estejam no controle dos seus dados financeiros, escolhendo com quem ele deseja compartilhá-los, com a possibilidade de escolher as melhores instituições e produtos financeiros para si.
“Nosso país se tornou referência na digitalização e é um dos mais digitalizados da América Latina”.
Para falar sobre as oportunidades de negócios entre Portugal e Brasil, Jorge Henriques, da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), falou sobre as principais potencialidades dos dois países para crescimento e geração de negócios, de investimentos e de inovação, a partir da colaboração entre os governos e as associações empresariais, como o LIDE.
“Sabemos que Portugal é um país médio na Europa, mas seu peso e relevância se constroi na cooperação com seus principais aliados. A relação entre os dois países é de importância fundamental e queremos caminhar em conjunto para desenvolver o ecossistema de negócio entre eles", afirmou. “Existe um potencial enorme na América Latina que deve ser explorado, os mercados são acessíveis e interessantes, desta forma a União Europeia é igualmente um mercado que o Brasil pode e deve relacionar-se".
Henriques reforçou mais uma vez a importância do fortalecimento das relações de negócios entre as duas regiões, destacando que é fundamental a conclusão do acordo comercial entre União Europeia e o Mercosul, para atingir esse objetivo.
Investimentos
Para dar início à última plenária da manhã, Henrique Meirelles, Co-chairman do Grupo LIDE, ministro da Fazenda (2016-2018) e presidente do Banco Central (2003-2010), falou sobre a crescente demanda por investimentos no Brasil e, principalmente, a sustentabilidade desses investimentos a longo prazo. Quando se analisa as fontes de crescimento econômico brasileiro, há as despesas públicas que injetam recursos na economia, porém, que não são sustentáveis a longo prazo.
Nesse sentido, explicou: “o que realmente está surpreendendo no crescimento brasileiro é resultado das reformas estruturais feitas no governo Temer que estão gerando um aumento importante da produtividade brasileira, aumentando a produtividade, diminuindo a burocracia e a judicialização dos conflitos".
Além disso, endereçou a reforma tributária, que está sendo regulamentada e será vital para o crescimento sustentável do país. Segundo Meirelles, a indústria brasileira precisa aproveitar as oportunidades de negócios internacionais. Existe grande demanda por investimentos em infraestrutura, indústria automobilística e de consumo.
Em seguida, Marcelo Bastos, fundador da Sizebay, fashiontech brasileira que desenvolve provadores virtuais e outras tecnologias para o setor da moda para mais de mil clientes ao redor do mundo. Ele apresentou detalhes sobre o processo de fusão em expansão internacional da empresa em parceria com a Audaces, chegando aos e-commerces chineses, marcas de luxo e grandes varejistas, prova da inovação brasileira na tecnologia e seu potencial global. “Nossa intenção é tornar o setor da moda no Brasil mais produtivo e competitivo”, afirmou.
João Kepler, CEO da Bossa Nova Investimentos, falou em sua exposição sobre o papel das startups para a inovação no Brasil e, principalmente, para oportunidades de investimento e crescimento econômico. Atualmente, investem em mais de 1700 empreendedores brasileiros e estrangeiros, principalmente em startups no primeiro estágio, permitindo que elas se desenvolvam e tragam retornos significativos para a economia e para outras grandes empresas.
“Temos acertado em acreditar em startups pequenas, focadas no setor de serviços. Essa comunidade de empreendedores tem crescido e evoluído bastante, mas precisam de muita ajuda: se a receberem, podemos levar as empresas a crescer para novos patamares, se tornando uma grandes empresas também".
O presidente do Conselho de Administração da Mapfre, secretário de estado do tesouro e das finanças de Lisboa (1999-2000), presidente do Conselho de Administração da Bolsa de Valores de Lisboa (1999), António Pereira Leite, levou aos presentes um pouco de sua experiência com investimentos internacionais em Portugal. Ele analisou o cenário geopolítico e econômico da União Europeia enquanto bloco comercial, além de características de principais nações do continente, como endividamento e equilíbrio das contas públicas, bancarização e reavalição de cadeias de valor para exemplificar algumas oportunidades e desafios na capitalização de empresas.
“Vemos em todo mundo uma tendência protecionista da economia, e hoje há muito mais possibilidade de comércio entre países com afinidades políticas do que entre nações que estão em blocos opostos”, observou.
Encerrando o painel, o Secretário dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Portugal, Nuno Sampaio, lembrou o potencial do relacionamento estratégico entre os dois países para a geração de riquezas. Nos últimos anos, segundo ele, ficou provada a necessidade dos empresários e governos se adaptarem rapidamente às mudanças, guerras, eleições, pandemias, que trazem desafios aos investimentos.
"Mesmo assim, a ligação entre Portugal e Brasil resistiu a tudo isso, ela é inquebrável. Essa ligação pode ser ser mais ou menos forte no futuro, dependendo somente das nossas ações hoje", analisou. “Para nós, isso é um ativo extraordinário".
Painel especial: Pedro Reis
Com extensa trajetória internacional, com foco na tração de investimentos para o país lusófono e geração e atração de inovação e tecnologia, o ministro da economia de Portugal, Pedro Reis, teve a oportunidade de apresentar uma conferência exclusiva aos participantes. Ele se propôs a trazer um panorama sobre o atual estado da economia portuguesa e as perspectivas de investimento para o futuro.
Segundo ele, o país está bem posicionado como um captador de investimentos e hub de inovações como porta de entrada para três grandes mercados: europeu, africano e latino-americano.
Isso se dá por uma série de fatores como a qualidade das infraestruturas logísticas e de comunicação, consideradas state of the art quando comparadas às maiores nações do mundo, capacidade de geração de energias renováveis com investimentos privados e concessões, atração de talentos, segurança pública, estabilidade e qualidade de vida. Tudo isso, na opinião do ministro, permite atrair a atenção e o investimento internacional.
“Estamos muito focados em implementar políticas amigas dos investidores, nossa prioridade é fazer a economia crescer em parceria com o setor privado", explicou. “Para isso acontecer, o melhor que o estado pode fazer é deixar as empresas respirarem e crescerem". Por isso, exemplificou alguns dos programas para acelerar a economia, como a baixa taxação sobre lucro das empresas.
Para ele, os principais desafios de Portugal são a escalar e a capitalizar as empresas, e o Brasil tem isso. "Precisamos fazer dar match, criando as condições certas e fomentando os investimentos, deixando os negócios florescerem", apontou. "Menos palavras e mais ação".