Ricardo Mussa, CEO da Raízen: 'E2G contribui no enfrentamento das mudanças climáticas'
Em entrevista exclusiva, o CEO da Raízen, Ricardo Mussa, fala sobre a aposta da companhia no etanol de segunda geração e o papel do Brasil na descarbonização.
Ricardo Mussa, CEO da Raízen. (Foto: Divulgação/Raízen)
Visto como peça fundamental na transição energética, o etanol de segunda geração em larga escala (E2G), é também aposta da maior empresa sucroalcooleira do mundo, a Raízen. Produzido a partir do bagaço extraído no processamento da planta, o produto ganha espaço na indústria pelo seu melhor desempenho na produção do etanol. De acordo com o CEO da companhia, Ricardo Mussa, o bicombustível feito a partir desta escolha tem potencial de elevar em 50% a capacidade de produção com a mesma área plantada.
A vantagem competitiva do produto entra também no hall de investimentos da Raízen, que prevê, até 2030, 20 plantas dedicadas ao E2G, tendo já nove anunciadas. Nesta entrevista exclusiva. Mussa detalha o papel importante do agronegócio brasileiro na sustentabilidade e o que enxerga para o futuro do país quando o assunto é descarbonização.
Por muitas vezes, o agro é visto como vilão no processo de sustentabilidade. Mas qual o papel deste setor na transição energética, pensando em biocombustíveis?
O Brasil é referência na descarbonização, com um histórico consistente no desenvolvimento de produtos renováveis que, com a grande disponibilidade de resíduos agrícolas, reforçam o papel crucial do País na transição energética. No agronegócio, seguindo os princípios da economia circular, o que antes era subproduto ou resíduo vira matéria-prima limpa para novas soluções. Nesse contexto, destacam-se os biocombustíveis, produzidos com biomassa, matéria-prima orgânica não fóssil, incluindo a cana-de-açúcar.
A exemplo disso, no Brasil, a cana produz quase 20% de toda a demanda de energia do País, sendo a terceira maior fonte de eletricidade para a população brasileira, o que mostra como novas formas de pensar sobre os modelos de produção, consumo e reaproveitamento da matéria já é uma realidade no setor.
Trazendo para a realidade do nosso negócio, enxergamos a matéria-prima como uma das maiores apostas para a transição de baixo carbono e, por isso, extraímos o máximo do potencial energético da cana-de-açúcar para produção de biocombustíveis, bioeletricidade e bioprodutos. Hoje, a Raízen é a maior produtora de etanol da cana do mundo.
No agronegócio nacional, que tem modelo único de atuação, controle dos insumos e tecnologias proprietárias, temos o potencial de exportar cada vez mais nossa experiência e produtos para o resto do mundo.
Você já mencionou que os carros híbridos são a solução inteligente para descarbonizar o Brasil. Qual o espaço de crescimento desta tecnologia no mercado nacional e internacional?
Os híbridos podem ser uma via mais rápida para aliar transição e escala. Como o maior produtor global de etanol de cana-de-açúcar, no Brasil, os híbridos, funcionando com combustíveis líquidos com baixa pegada de carbono, também se beneficiam pela nossa realidade de mercado, com grande disponibilidade de biocombustíveis. A exemplo disso, nossa frota de veículos leves representavam uma fatia de quase 70%, a maior do mundo em 2019.
Isto é, sua capacidade de combinar um motor elétrico e outro a combustão faz com que eles tenham grandes benefícios em comparação com outras alternativas, entregando eficiência e dando ao consumidor maior poder de escolha ao unir a autonomia que a gasolina proporciona com uma opção mais sustentável contra as mudanças climáticas.
Como entra o etanol de segunda geração (E2G) neste contexto brasileiro? Qual a aposta da Raízen?
Uma das nossas principais apostas na área de biocombustíveis avançados é a produção do etanol de segunda geração em larga escala. O E2G é peça fundamental na transição energética e contribui diretamente no enfrentamento das mudanças climáticas, pois sua pegada de carbono é 30% inferior ao etanol convencional, já que utiliza resíduos para a sua produção. O biocombustível, produzido a partir do bagaço extraído no processamento da cana-de-açúcar, tem potencial de elevar em 50% a capacidade de produção de etanol com a mesma área plantada.
Atualmente, a Raízen pretende atingir 20 plantas de E2G até 2030, com nove já anunciadas, chegando a uma capacidade instalada de 1,6 bilhão de litros de etanol de segunda geração. A estimativa é que cada planta tenha capacidade de produção de 82 milhões de litros e CAPEX de R$ 1,2 bilhão por unidade.
Além dos meios que já conhecemos, podemos esperar novas tecnologias para biocombustíveis?
Sim, os biocombustíveis estão no coração da transição energética e são soluções eficientes para a substituição de combustíveis fósseis como a gasolina. Esse potencial vem atrelado à necessidade em encontrar uma alternativa econômica e ambiental. Na Raízen isso não é diferente. Utilizamos tecnologias avançadas para testar, de forma contínua, o potencial de expansão para outros processos e a descarbonização por meio de um robusto portfólio de energias renováveis.
Nossas plantas deixaram de ser usinas para se tornarem o que chamamos de Parques de Bioenergia, com maior integração de tecnologias para desenvolvimento e aproveitamento máximo de todos os recursos.
Como resultado, além de produções já consolidadas, como o açúcar, etanol, biogás e geração de energia a partir de biomassa, também estamos olhando para os biocombustíveis avançados, participando ativamente no desenvolvimento de soluções para os setores de difícil descarbonização, os chamados “hard-to-abate sectors”, que buscam soluções, incluindo o combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês), o biobunker para embarcações marítimas de longo percurso, projetos de hidrogênio verde obtido a partir de etanol de cana e outras soluções. Todas essas soluções nos posicionam como um ator relevante nesta jornada que se inicia.
Qual o potencial do Brasil em exportar energia renovável? Como a Raízen enxerga esse cenário?
O Brasil possui uma matriz energética predominantemente renovável, seja na área de energia elétrica ou no transporte. Na matriz elétrica, as fontes renováveis representam 84,8% do todo o suprimento, o que nos posiciona como o país com renovabilidade três vezes maior do que a média mundial.
Isso, juntamente com o uso em larga escala de etanol e biodiesel no setor de transportes, faz com que a matriz energética total brasileira tenha potencial de gerar entre 360 e 1.200 Mt CO2 de créditos no mercado voluntário em 2030, 15% da oferta mundial. Nosso país se diferencia por incentivar maior eficiência energética e máximo aproveitamento dos recursos naturais e estamos investindo em produtos que representam uma alternativa limpa e sustentável para mitigar os impactos provocados pelas mudanças climáticas.
Nesse contexto, a Raízen atua de forma consistente ampliando cada vez mais seu portfólio de renováveis, seja por meio dos nossos Parques de Bioenergia ou através de tecnologias avançadas como o etanol celulósico, etanol comum, geração de energia elétrica a partir de resíduos do processo de produção do açúcar e etanol, como bagaço e vinhaça, e o biometano.
Todas essas iniciativas reforçam nosso compromisso de redefinir o futuro da energia e contribuem hoje para uma economia de baixo carbono, evitando 5,2 milhões de toneladas de CO2 da atmosfera por ano. Até 2030, a Raízen deve chegar ao patamar de redução de 10 milhões de toneladas de CO2 anualmente.