Países colocam a tributação no centro de suas políticas de sustentabilidade
Essa estratégia busca fazer com que as empresas concentrem esforços em todas as áreas da sustentabilidade, como descarbonização e economia circular, distribuindo inclusive incentivos fiscais que já chegam a 3,6 mil em todo o mundo.
Estratégia busca fazer com que as empresas concentrem esforços em todas as áreas da sustentabilidade, como descarbonização e economia circular. (Foto: Freepik)
Os governos estão usando cada vez mais os instrumentos de tributação, como taxação e incentivos, para direcionar o comportamento das empresas no sentido de contribuir para o sucesso das políticas de sustentabilidade traçadas. O objetivo principal é fazer com que as empresas realmente concentrem esforços em todas as cinco áreas da política de sustentabilidade: climáticas (para redução das emissões dos gases de efeito estufa); economia circular; biodiversidade e água; minimização da poluição; e mudanças dos padrões de consumo e de vida voltadas para esse propósito da sustentabilidade.
“O Brasil está fazendo muito bem esse trabalho de contemplar todos os aspectos ambientais em suas políticas. Ainda que o clima seja sempre o mais comentado, não dá para considerá-lo de forma isolada, havendo necessidade de integrá-lo com os outros aspectos da sustentabilidade, como a biodiversidade e água. Também é por meio dessa integração que os países se protegem de qualquer tipo de retrocesso”, destacou Alenka Turnsek, Sustainability Tax Policy Leader da EY Global, no evento “Novo Cenário Global de Sustentabilidade na Estratégia Corporativa: Impactos no Negócio e a Agenda Tributária”, realizado pela EY no seu escritório em São Paulo. “No caso do Brasil, que representa os pulmões do mundo, esse olhar para a biodiversidade e água é ainda mais relevante, já que o combate às mudanças climáticas começa pela manutenção das florestas”.
Há no momento mais de 3,6 mil incentivos disponíveis globalmente para as atividades ligadas à sustentabilidade, conforme observou Alenka. Eles estimulam basicamente algum, alguns ou todos os três tipos de comportamento a seguir: redução no consumo de recursos naturais; transição para fontes de energia renováveis; e inovação para criação de produtos e de processos de manufatura de baixo carbono. São 2,9 mil incentivos para o primeiro comportamento, por meio do estímulo à construção ou retrofit de instalações com o propósito de torná-las eficientes do ponto de vista energético e para o desenvolvimento de tecnologias de redução de emissões, incluindo ganho de eficiência energética dos equipamentos.
Outros dois mil incentivos estão voltados para o segundo tipo de comportamento, com destaque para o estímulo aos combustíveis alternativos e à geração de energia renovável como solar e eólica. Por fim, em relação ao terceiro tipo, com 150 iniciativas dedicadas, o incentivo é dado em formato de créditos para pesquisa e desenvolvimento, subvenção para fundos de pesquisa e descontos no financiamento do treinamento para empregos verdes.
Ainda como parte desse contexto, as políticas de economia circular têm ganhado espaço em todo o mundo, buscando reduzir o desperdício, minimizar a poluição gerada pela atividade produtiva e aumentar a eficiência no uso dos recursos. Os países estão focados na redução dos resíduos e da poluição, priorizando plásticos e eletrônicos nas suas políticas. “Há várias formas de implementar uma política de economia circular que envolvem diferentes complexidades. Um nível mais básico é criar formas eficientes de converter o resíduo em energia e outros materiais. O mais avançado está na geração do mínimo possível de resíduo durante a produção, já desenhando os produtos para minimizar seu impacto ambiental ao longo do seu ciclo de vida”, disse Alenka.
Impactos para além das suas fronteiras
As empresas não estão apenas sujeitas às políticas de sustentabilidade dos países nos quais têm operação. Tem crescido um movimento no mundo de criação de mecanismos que indiretamente forçam outros países a seguirem regras que não foram feitas por eles. “O que temos visto é que a movimentação de venda de produtos para determinados mercados tem sido submetida a essa tributação voltada para a sustentabilidade, também chamada de Tax Sustainability. Os países constataram que suas alfândegas são pontos eficientes para determinar novos comportamentos das empresas. Por isso, cada vez mais, é preciso olhar com atenção para os mercados em que você vende e também para seus fornecedores”, explicou Sergio Fontenelle, sócio de gestão de tributos da EY Brasil, que também participou do evento da EY.
Exemplo nesse sentido é o CBAM (Carbon Border Adjustment Mechanism), um mecanismo aduaneiro de taxação de carbono para determinados produtos exportados para a União Europeia. Os importadores europeus serão responsáveis pelo compliance e pelos pagamentos dos certificados de CBAM quando eles forem exigidos.
“Por enquanto, estamos no período de transição, sem produção de impactos financeiros para esses importadores, mas as empresas que exportam para a UE, inclusive brasileiras, já precisam começar a se adaptar a essas regras”, observou Fontenelle. “No momento, elas precisam reportar, para os importadores europeus, as emissões de carbono dos produtos que exportam nas seguintes categorias: aço, ferro, alumínio, eletricidade, hidrogênio, fertilizantes e cimento. Essas categorias são intensivas em carbono, motivo pelo qual já estão contempladas no CBAM”, disse o executivo.
Ainda segundo Fontenelle, a UE, por ter o compromisso de ser carbono neutro até 2050, está criando uma legislação bastante restritiva em relação à emissão de carbono. “Nas importações, que são cadeias de fora da União Europeia, ela naturalmente não tem jurisdição, não podendo, portanto, exigir nenhum comportamento das empresas. Para contornar isso, ela cria uma espécie de tributo para fazer com que as empresas europeias possam ser penalizadas por fazer negócios com empresas de fora da UE, que podem não estar sujeitas em suas jurisdições às mesmas regras restritivas de emissão de carbono que valem nesse bloco econômico”, observou.
Alenka pontuou que países como China, Turquia e Coreia do Sul estão introduzindo mercados de carbono já em compliance com o CBAM. “Há, no entanto, preocupação com algumas jurisdições que podem não suportar o aumento do custo para fazer negócios causado por essa conformidade”, finalizou.