Guerra tarifária pode alterar comércio internacional com impactos para empresas
A imposição das tarifas de importação pelos EUA pegou as organizações de surpresa, que têm agora como desafio entender os reflexos nos seus setores econômicos.
Waine Peron, sócio-líder de impostos da EY Brasil. (Foto: Divulgação)
As últimas semanas foram agitadas para o comércio internacional, com a imposição de uma série de tarifas pelos Estados Unidos para diversos países. Embora houvesse uma indicação de que o governo Trump seria protecionista, o tarifaço não estava no radar das empresas, que estão buscando agora entender os reflexos econômicos no setor em que atuam. “O que temos visto recentemente é que a política de comércio internacional tem sido usada pelo governo americano de uma forma sem precedentes. A globalização não está no fim, mas sendo alterada radicalmente, e isso pode trazer oportunidades para o Brasil”, disse Ian Craig, sócio-líder de tributação aduaneira da EY Brasil, que participou do 16º Seminário Internacional de Impostos realizado pela EY em São Paulo com a presença de executivos de empresas de diversos setores.
A China, em resposta à guerra tarifária, de acordo com a emissora estatal CCTV, já está substituindo a soja produzida pelos EUA por aquela advinda do Brasil. A projeção é que, em abril, foram descarregadas no país 700 mil toneladas de soja brasileira – um aumento de 32% em relação ao mesmo mês do ano passado. “Paralelamente a essa substituição de importação, a China pode direcionar seus investimentos dos EUA para o Brasil. Os chineses têm investido pesadamente nos Estados Unidos, e o Brasil aparece como um substituto perfeito para receber esses aportes”, afirmou Craig.
Ainda segundo o executivo, é importante, no entanto, que o Brasil continue progredindo como um destino atraente para receber investimentos por meio do oferecimento de facilidade para fazer negócios. “As reformas recentes no ambiente tributário, como as dos tributos indiretos, e a adequação do país ao sistema tributário global, com o Pilar 2 e o preço de transferência, tornam o ambiente mais atrativo para receber investimentos”, finalizou.
Para Waine Peron, sócio-líder de impostos da EY Brasil, que também participou do evento, as tarifas alfandegárias trazem não apenas oportunidades de negócio para as empresas que atuam no Brasil como a necessidade de avaliar os custos decorrentes.
“Os profissionais tributários estão sendo chamados para debater os efeitos das tarifas na operação das suas empresas. Além desse olhar para eventuais oportunidades, eles podem indicar o custo da incidência das tarifas no negócio, entendendo até onde pode ser repassado para o preço final dos produtos”, disse.
Fortalecimento do nearshoring
O tarifaço fortalece novamente, a exemplo do que ocorreu na pandemia, o movimento chamado de nearshoring. “A pandemia trouxe rupturas na cadeia de fornecimento, demonstrando sua vulnerabilidade e alterando a logística do mundo, com a adoção pelas empresas do nearshoring, que é basicamente trazer a produção para perto do seu mercado. Neste momento, com tantas tarifas sendo impostas, a tendência é de continuidade desse movimento”, analisou Gustavo Carmona, sócio-líder de serviços de impostos internacionais e transações da EY Brasil.
Planejamento focado em tarifas
Em um setor como o de aviação comercial, que convivia globalmente com tarifas zero de importação desde 1979 para aeronaves civis, peças e serviços, por força de um acordo internacional, os efeitos causados pelo tarifaço têm sido ainda maiores.
“Nesse cenário anterior, nunca tivemos a preocupação de estruturar a cadeia de valor de uma forma que olhasse para a tarifa como foco do planejamento”, disse Daniel Cordeiro, Global Finance Director - Tax & Accounting da Embraer, que esteve no evento promovido pela EY. “Temos agora o desafio de reestruturar nossa cadeia de valor ao mesmo tempo que estamos nos adequando às mudanças tributárias como a reforma dos indiretos, o Pilar 2 e as regras do preço de transferência alinhadas às da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico)”, completou.
Na visão dele, há uma mudança de perfil de Tax dentro das empresas, com sua plena integração ao negócio. “Falávamos antes ocasionalmente com as outras áreas, mas hoje precisamos interagir o tempo inteiro. O pessoal de suprimentos, por exemplo, precisa analisar a melhor estratégia para fazer as compras, o que passa por nós de Tax. O financeiro como um todo está muito ligado ao nosso trabalho”, finalizou.