Investir em receitas públicas é melhor do que cortar gastos para a elevação do PIB

Marina Sanches analisa Nota de Política Econômica que comparou diferentes cenários para o controle de ajustes fiscais na economia.

hand-holding-growth-arrow-with-coinsAjustes fiscas impactam na economia nacional. (Foto: Freepik)

A Nota de Política Econômica (NPE) 55, com o título Ajuste Via Receita ou Via Gasto?, analisa os cenários de ajuste fiscal considerando estimativas de efeitos multiplicadores. A pesquisa atualiza as estimativas de multiplicadores fiscais de diferentes componentes do gasto e da receita no Brasil e utiliza os resultados para simular o efeito de diferentes políticas de ajuste fiscal. Marina Sanches, doutoranda pela Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP, pesquisadora do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made) e uma das autoras da nota, analisa os resultados da pesquisa e comenta os impactos dos ajustes fiscais na economia nacional.

Conforme a especialista, em julho, o governo federal anunciou um corte significativo de R$ 15 bilhões no orçamento de 2024, com o objetivo de cumprir as metas fiscais estabelecidas. A medida visa a manter as contas públicas dentro dos limites de gestão fiscal, mas ela explica que a forma como o ajuste será implementado pode ter consequências importantes para a economia, tanto a curto quanto a longo prazo.

Segundo a pesquisadora, a estratégia de ajuste fiscal pode ser realizada por meio de cortes de gastos ou aumento de receitas. A escolha entre essas abordagens afeta diretamente o PIB, o déficit primário e a desigualdade, com diferentes impactos econômicos dependendo do tipo de gasto ou receita ajustada e esses ajustes podem ter efeitos muito variados na economia.

No estudo conduzido pelo Made, três cenários de ajuste fiscal foram simulados. O primeiro cenário envolve um ajuste de 1% do PIB por meio de cortes de gastos. O segundo cenário foca no aumento de receitas, enquanto o terceiro combina aumento de receita com elevação de gastos. “Cada uma dessas abordagens gera resultados distintos em termos de crescimento econômico e gestão da dívida pública”, esclarece Marina.

Cenários

De acordo com a doutoranda, os multiplicadores fiscais são um conceito central na análise desses cenários, pois medem o impacto das mudanças na política fiscal sobre o PIB ao longo do tempo. Marina detalha que, para o País, investimentos públicos e benefícios sociais são os gastos com maior efeito multiplicador e que as atualizações baseadas em dados de 1997 a 2023 confirmam que esses gastos têm um impacto significativo no crescimento econômico.

Marina explica que investimentos públicos, como a construção de infraestrutura, têm um multiplicador fiscal alto. A pesquisadora aponta que cada real investido pode aumentar o PIB em até R$ 2,60 após 25 meses, enquanto benefícios sociais também mostram um impacto positivo, com cada real gasto resultando em um aumento de R$ 2,15 no PIB. Ela conta que esses tipos de gastos são fundamentais para promover o crescimento econômico e melhorar a relação entre dívida e PIB.

Gasto ou receita?

Conforme Marina Sanches, o estudo revela que cortar investimentos públicos resulta em uma queda no PIB e um aumento na razão da dívida pública e cortes em benefícios sociais também reduzem o PIB, embora de forma menos pronunciada. Em contraste, ajustes que aumentam receitas enquanto mantêm gastos constantes têm um impacto negativo menor no PIB e reduzem a relação dívida/PIB.

Segundo a doutoranda, quando os ajustes fiscais combinam aumento de receita com elevação de gastos o efeito é positivo. Ela explica que aumentar investimentos públicos e benefícios sociais simultaneamente resulta em um efeito líquido positivo sobre o PIB e essa combinação é vista como a melhor abordagem para equilibrar a atividade econômica com a sustentabilidade da dívida.

“Os investimentos públicos e os benefícios sociais têm um alto efeito multiplicador porque estimulam a produtividade e o consumo. Esse efeito, resultante dos investimentos em infraestrutura, e o aumento do consumo pelos beneficiários sociais são exemplos de como tais gastos podem impulsionar a economia. Além disso, o aumento de receita poderia ser combinado com medidas que aumentem a produtividade do sistema tributário, que é muito injusto”, analisa.