Governo deve incentivar o investimento privado com a redução do custo de capital

Redução do custo de capital de 16,5% para 9% ao ano faria empresas de capital aberto com condições favoráveis para investir dobrasse

carlos antonio roccaCarlos Antonio Rocca, doutor em economia pela FEA-USP e sócio-diretor da CRC Consultores Associados. (Foto:Divulgação)

Uma redução do custo de capital de 16,5% para 9% ao ano faria com que a proporção de empresas de capital aberto com condições favoráveis para investir praticamente dobrasse, saindo de 34% para 60% das companhias que estão na bolsa de valores brasileira. Isso porque haveria taxas de retorno superiores ao custo de captação do dinheiro e, nesse universo de 450 empresas, 270 passariam a vislumbrar condições favoráveis à decisão de investir — ante apenas 153 no cenário de custo de capital de 16,5% ao ano.

“Esse é o grande desafio da política econômica do novo governo. A prioridade deve ser criar melhores condições para as empresas privadas, que respondem por 90% dos investimentos realizados no país”, diz Carlos Antonio Rocca, doutor em economia pela FEA-USP e sócio-diretor da CRC Consultores Associados. 

Na visão de Rocca, dois fatores são fundamentais para estimular o investimento privado no país: estabilidade macroeconômica e custo de capital estável ou previsível e em patamar mais baixo do que atualmente, o que é condicionado pela taxa básica de juros ou Selic. “Quanto maior a taxa de juros definida pelo Banco Central, menor o número de projetos privados viáveis”, observa.

De acordo com um ranking divulgado em dezembro de 2022 pela gestora de recursos Infinity Asset, o Brasil, considerando a Selic atual, de 13,75% ao ano, e a inflação projetada para os próximos 12 meses, tem os maiores juros reais do mundo, com 8,16% ao ano, seguido pelo México, com 5,39%, e pelo Chile, com 4,66%. A taxa de juro real é calculada descontando da taxa nominal a inflação do período (nesse caso, a esperada para os próximos 12 meses). O momento continua sendo de política monetária restritiva com o objetivo de controlar a inflação, que cresceu no Brasil e no mundo como reflexo econômico da pandemia.

“É importante, ainda, estimular o ganho de produtividade no setor privado, o que se dá por meio do avanço tecnológico”, diz Rocca. Para que isso seja possível, deve haver a plena integração da economia brasileira com a mundial, o que facilita, por exemplo, a importação de tecnologia. “A aprovação da reforma tributária, alçada à prioridade do novo governo, também contribuirá para o aumento da produtividade, pois, entre outros pontos, tornará o sistema tributário menos complexo, facilitando o trabalho de conformidade tributária”, afirma Rocca.

Aumento do investimento público

Uma das discussões atuais mais comuns é se a elevação do investimento público geraria maior crescimento econômico, retirando o Brasil de um crescimento potencial do PIB na faixa de 1,5% a 2% ao ano, o que se mostra insuficiente para proporcionar mudança significativa da situação social. Em 2021, a União respondeu por apenas 0,34% do investimento, enquanto as empresas privadas foram responsáveis por 17,05%. Rocca questiona se dobrar essa taxa de investimento do governo federal faria alguma diferença para o crescimento da economia.

“Não me parece que passar a ter um investimento de 0,68% da União seja indicado frente aos possíveis efeitos desse movimento. O problema é que o aumento do investimento público pode ser interpretado pelo mercado como risco fiscal, ocasionando a elevação da taxa básica de juros e inibindo, como constatamos no estudo, o investimento privado”, explica. Por isso, para Rocca, o efeito multiplicador para o PIB é muito maior se forem ofertadas condições favoráveis ao investimento privado, o que se dá apenas se houver juros baixos ou, ao menos, uma indicação no horizonte de que os juros serão reduzidos.

“Juros menores em cinco ou dez anos vão depender da redução ou, ao menos, da estabilização da dívida pública”, afirma Rocca. É esse cenário de endividamento público controlado que possibilitará ao Brasil alterar sua realidade social, motivo pelo qual a responsabilidade fiscal não pode ser colocada em oposição à responsabilidade social. Por meio da responsabilidade fiscal, serão criadas condições para o crescimento econômico sustentável do país, que é indispensável para o avanço social.

O especialista faz a ressalva de que o investimento público pode ser bem-recebido pelo mercado se vier para impulsionar determinado setor ou atividade econômica. “Os programas de concessão e de PPP (parceria público-privada) já se provaram um sucesso no Brasil, especialmente em infraestrutura, resultando em obras que elevaram a produtividade.”