Inteligência artificial: PL pretende criminalizar fraude publicitária

Além do tema da regulação da IA ainda merecer mais estudos e debates, entendemos dispensável, na medida em que o próprio Código de Defesa do Consumidor traz como infração penal.

FAbiola MeiraFabíola Meira, sócia-fundadora do escritório Meira Breseghello Advogados. (Foto: Divulgação)

O PL 6119/24 pretende criar um novo tipo penal – o crime de “fraude publicitária com uso de inteligência artificial” para aquele que “Criar, utilizar e propagar vídeos de pessoas famosas ou anônimas criados por inteligência artificial com a finalidade de manipular, enganar e induzir a erro consumidores”.

Vale mencionar que o uso da IA na publicidade tem sido um tema de estudos e debates, inclusive com a divulgação do Guia ABA (Associação Brasileira de Anunciantes) sobre “Impactos da Inteligência Artificial Generativa na Publicidade”, na medida em que, entre inúmeras outras possibilidades, a ferramenta é capaz de auxiliar na produção de conteúdo mais dinâmicos e criativos, analisar dados comportamentais, interagir com o consumidor, auxiliar na economia de tempo e custos na retomada na revisão e retomada de campanhas.

Entre as principais preocupações, além da indução em erro do consumidor, temos o problema dos vieses discriminatórios que possam vir a ocorrer, razão pela qual a boa governança no que se refere ao direito à não-discriminação, direito à privacidade, à proteção de dados pessoais e o cumprimento do princípio da identificação da mensagem publicitária, de forma que o consumidor, inclusive, saiba identificar a diferença entre verdade e ficção, é imprescindível.

Pois bem. Não obstante a importância da preocupação do legislador, sem prejuízo de outros Projetos de lei em andamento, acreditamos que além do tema da regulação da IA ainda merecer mais estudos e debates, no que se refere ao PL aqui citado, entendemos dispensável, na medida em que o próprio Código de Defesa do Consumidor, além da responsabilização civil e administrativa daquele que, de qualquer forma, enganar e induzir a erro o consumidor, traz como infração penal, por exemplo, fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre produtos ou serviços, bem como promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva ou capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança.

Neste aspecto, vale mencionar que a autorregulamentação publicitária, no Brasil, é absolutamente efetiva e respeitada e deve ser levada em conta pelos próprios órgãos de proteção e defesa do consumidor (tal como previsto no DL 2181/97). Esta traz parâmetros e princípios para que a publicidade não seja considerada enganosa ou abusiva. Especialmente em relação à IA, como é de conhecimento, o CONAR ao decidir sobre a publicidade da Volkswagen do Brasil que utilizou recursos de inteligência artificial para recriar a figura da cantora Elis Regina com sua filha Maria Rita entendeu que se tratava de anúncio ético, sendo determinado o arquivamento no que se refere ao debate envolvendo o dever de informar sobre o uso da inteligência artificial na publicidade.

Assim, considerando os deveres legais previstos no CDC, as regras da autorregulamentação publicitária em constante atualização, além de que a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo é Princípio da Política Nacional das relações de consumo, é imprescindível uma governança precisa e coerente, conhecedora do compliance consumerista no âmbito publicitário, para equilibrar desenvolvimento tecnológico e a vulnerabilidade do consumidor.