Abrão Neto, Amcham Brasil: 'Exportações brasileiras de bens para os Estados Unidos têm alcançado valores recordes'

CEO da Amcham aponta que o comércio bilateral continua a crescer, alcançando novos recordes em vários indicadores.

MMF_2386 (1)Abrão M. Árabe Neto, CEO da Amcham Brasil. (Foto: Divulgação)

A mais recente edição do Monitor do Comércio Brasil-EUA da Amcham Brasil indica o crescimento das trocas de bens entre os dois países no primeiro trimestre de 2024, alcançando o valor de US$ 18,8 bilhões, segunda maior marca na série histórica do comércio bilateral. Esse valor foi influenciado pelo recorde nas exportações brasileiras para os EUA tanto em valor como volume. O Brasil vendeu US$ 9,8 bilhões para o mercado norte-americano no período, um crescimento de 19,5% em valor e de 33,1% em quantidade.

Abrão M. Árabe Neto, CEO da Amcham Brasil - entidade que representa um terço do PIB brasileiro - explica que o resultado positivo do comércio de bens entre Brasil e EUA neste início de ano reforça a importância da nossa parceria bilateral. “O Brasil tem nos EUA um mercado prioritário e em expansão para os seus produtos, sobretudo de maior valor agregado", destaca.

À frente da entidade desde janeiro de 2023, Abrão Neto serviu como Secretário de Comércio Exterior (2016-2018) e Diretor de Negociações Internacionais, entre outras posições no Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC). Atualmente, é senior fellow no Atlantic Council e no núcleo Estados Unidos do CEBRI, bem como professor no curso de relações internacionais da ESPM. Nesta entrevista, a liderança analisa a intensificação do comércio e potencial das relações bilaterais entre os dois países.

Quais segmentos da economia estão no radar entre os dois países para um maior engajamento comercial nos próximos anos?

Mais recentemente, os segmentos relacionados à energia renovável e transição para uma economia de baixo carbono têm despontado como áreas de enorme interesse e potencial para maior engajamento entre Brasil e Estados Unidos.

Em um olhar mais amplo, os dois países possuem uma pauta econômica robusta, com mais de US$ 100 bilhões em trocas de bens e serviços por ano. No caso dos bens, o comércio bilateral é composto, em mais de 80%, por produtos de maior valor adicionado e intensidade tecnológica. Entre os segmentos que mais cresceram nos últimos anos estão aeronaves, máquinas e equipamentos, produtos químicos e siderúrgicos. Vale ressaltar que as exportações brasileiras de bens para os Estados Unidos têm alcançado valores recordes, consolidando o mercado norte-americano com o principal destino de vendas de produtos industrializados do Brasil, com US$ 29,9 bilhões contra US$ 23,5 bilhões para União Europeia e US$ 19,4 bilhões para o Mercosul.

No comércio de serviços, os Estados Unidos são o maior parceiro do Brasil tanto nas importações quanto exportações, com destaque para serviços financeiros, tecnologia da informação, manutenção e pesquisa e desenvolvimento.

Demandas e riscos globais podem aproximar ainda mais as duas nações?

Em clima e energias renováveis, a aproximação entre os dois governos tem crescido nos últimos anos. Os países criaram o Diálogo em Energia Limpa, bem como um roteiro de ações sobre, por exemplo, combustíveis sustentáveis para aviação e hidrogênio limpo. Eles também reativaram o Diálogo em Alto Nível sobre Mudanças Climáticas, lideraram a criação da Aliança Global sobre Biocombustíveis e assinaram uma cooperação para apoiar o Plano de Transição Ecológica do Brasil. Há, ainda, muito espaço para o avanço desses temas, inclusive investimentos, parcerias e cooperação regulatória, com enorme potencial de ganhos para ambos os países e o planeta.

Com o aumento de riscos geopolíticos, climáticos, sanitários, entre outros, Brasil e Estados Unidos também podem integrar mais suas cadeias bilaterais de fornecimento, em áreas como transformação mineral, semicondutores, fertilizantes ou complexo da saúde. Além da proximidade geográfica, parceria bicentenária, valores comuns e forte presença de empresas brasileiras nos Estados Unidos e vice-versa, o comércio intrasetorial já é significativo em vários segmentos, como o aeronáutico.

Neste momento, existem barreiras e conflitos que podem gerar ruídos nesta relação?

Em regra, Brasil e Estados Unidos possuem mais convergências do que divergências. É natural que países que tenham economias complexas e relação econômica bilateral diversificada e relevante tenham pontos de dissenso, por exemplo, relacionados a setores concorrentes, como agropecuário. A mesma coisa pode ocorrer em razão do agravamento das tensões geopolíticas. No entanto, a maturidade do relacionamento desenvolvido ao longo dos últimos dois séculos, bem como a existência de diversos mecanismos bilaterais de consulta entre governos, contribui para que ambos os países busquem construir consensos pragmáticos para os seus desafios.

O que muda como uma eventual eleição do ex-presidente Donald Trump?

As eleições são um fenômeno constante nas relações entre o Brasil e os Estados Unidos, dado que, a cada dois anos, há eleições presidenciais intercaladas. Sempre que há mudanças de governo, mudam-se as prioridades e surge a necessidade de recalibrar a relação. Na última mudança de administração do lado americano, por exemplo, aumentou a prioridade para temas de sustentabilidade e mudanças do clima. O principal é que a avaliação mútua sobre a importância da parceria bilateral, bem como os fortes interesses econômicos e empresariais, estimula uma visão pragmática e de estabilidade na relação.

Na sua opinião, qual o papel para o Brasil e para o presidente Lula em relação aos diferentes conflitos armados em andamento como na Ucrânia e no Oriente Médio?

O Brasil é um país que tem uma tradição diplomática muito consolidada e um histórico de contribuições importantes para construção de consensos multilaterais, seja na área comercial, econômica ou política. O caminho para o Brasil é continuar apoiando de forma construtiva a paz, priorizando a atuação em foros internacionais e condenando abusos, independente do lado.

Recente pesquisa da Amcham Brasil, revelou que 71% das empresas brasileiras adotam práticas ESG. Como a entidade tem atuado para promover o conceito entre seus associados?

Essa evolução revela que as empresas brasileiras estão cada vez mais convencidas da importância da agenda de sustentabilidade e engajadas em trilhar esse caminho. Por outro lado, também indica que ainda há muito por fazer. Afinal, uma parcela expressiva é de ‘adotantes iniciais’ de práticas ESG ou ainda estão planejando como aplicar essas medidas. Destaco que a Amcham atua na defesa de interesses para o aprimoramento de políticas públicas ambientais, um bom exemplo é o recente lançamento da agenda de prioridades legislativas da entidade, que contemplou diversas propostas para estimular energias limpas, como o combustível sustentável de aviação e o hidrogênio limpo até a criação do mercado regulado de carbono.