Clássico de Jorge Amado enfrenta tentativa de censura em Santa Catarina; entenda o caso
Capitães da Areia, livro de Jorge Amado considerado um clássico da literatura brasileira, é o mais novo alvo de um movimento de proibição de determinadas obras nas escolas. A vereadora Jéssica Lemoine (PL), de Itapoá, em Santa Catarina, solicitou que a obra seja retirada do currículo das escolas da cidade. Para ela, o livro "promove a marginalização infantil, romantiza o estupro e a relação sexual entre adultos e crianças".
Durante sua fala em sessão na Câmara Municipal, a vereadora disse que considera a obra inapropriada para crianças e que a classificação indicativa do livro teria sido reduzida de 18 para 14 anos, como forma de permitir o uso da obra no material didático para alunos do 7º e 8º ano do ensino fundamental (que têm entre 12 e 13 anos).
No entanto, ao contrário de filmes e outros tipos de mídia, não há obrigatoriedade de indicação etária para livros no País, já que o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), órgão responsável pela regulamentação, não os considera produtos classificáveis. Dessa forma, fica a critério das editoras sugerir ou não uma faixa etária.
Jéssica Lemoine disse, ainda, que a presença de um "escritor comunista" como Jorge Amado no currículo escolar seria uma tentativa de "infiltração da esquerda" na educação. Ela afirma que levantou a pauta na câmara por pedido de um munícipe, pai de uma criança. "Não sou contra esse livro, inclusive espero que siga disponível na Biblioteca Municipal, porque esse tipo de leitura cai no vestibular", acrescentou a vereadora.
O vídeo do discurso foi compartilhado por Jéssica no Instagram em 16 de junho. Na legenda, escreveu: "Isso não é censura, é respeito com nossas crianças e adolescentes, esse livro pode estar na biblioteca para uso de quem tenha idade adequada." O conteúdo passou a ter maior repercussão nas redes sociais somente na quarta-feira, 2 de julho.
Sobre o que é Capitães da Areia
Publicado em 1937, o romance de Jorge Amado acompanha o cotidiano de um grupo de meninos nas ruas de Salvador, Bahia. Abandonados, eles vivem à margem da sociedade e lutam pela sobrevivência, recorrendo a roubos e sonhando com um futuro melhor. A obra explora as contradições de uma infância marcada pela violência e o abandono.
ABL repudia nova tentativa de censura a livros em nota
Nesta quinta, 3, a Academia Brasileira de Letras (ABL) divulgou uma nota de repúdio assinada por Merval Pereira, presidente da instituição.
"A Academia Brasileira de Letras vem mais uma vez se posicionar contra a tentativa de censura a livros, como acontece agora em Santa Catarina. Escrito em 1937, o livro Capitães de Areia vem sendo admirado desde então. O acadêmico Jorge Amado, um dos nossos maiores escritores, reconhecido internacionalmente, ser discriminado por suposta influência política comunista, a essa altura do século 21, chega a ser patético. Até porque Jorge Amado renegou o comunismo em 1956", diz a nota.
Capitães da Areia, livro de Jorge Amado considerado um clássico da literatura brasileira, é o mais novo alvo de um movimento de proibição de determinadas obras nas escolas. A vereadora Jéssica Lemoine (PL), de Itapoá, em Santa Catarina, solicitou que a obra seja retirada do currículo das escolas da cidade. Para ela, o livro "promove a marginalização infantil, romantiza o estupro e a relação sexual entre adultos e crianças".
Durante sua fala em sessão na Câmara Municipal, a vereadora disse que considera a obra inapropriada para crianças e que a classificação indicativa do livro teria sido reduzida de 18 para 14 anos, como forma de permitir o uso da obra no material didático para alunos do 7º e 8º ano do ensino fundamental (que têm entre 12 e 13 anos).
No entanto, ao contrário de filmes e outros tipos de mídia, não há obrigatoriedade de indicação etária para livros no País, já que o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), órgão responsável pela regulamentação, não os considera produtos classificáveis. Dessa forma, fica a critério das editoras sugerir ou não uma faixa etária.
Jéssica Lemoine disse, ainda, que a presença de um "escritor comunista" como Jorge Amado no currículo escolar seria uma tentativa de "infiltração da esquerda" na educação. Ela afirma que levantou a pauta na câmara por pedido de um munícipe, pai de uma criança. "Não sou contra esse livro, inclusive espero que siga disponível na Biblioteca Municipal, porque esse tipo de leitura cai no vestibular", acrescentou a vereadora.
O vídeo do discurso foi compartilhado por Jéssica no Instagram em 16 de junho. Na legenda, escreveu: "Isso não é censura, é respeito com nossas crianças e adolescentes, esse livro pode estar na biblioteca para uso de quem tenha idade adequada." O conteúdo passou a ter maior repercussão nas redes sociais somente na quarta-feira, 2 de julho.
Sobre o que é Capitães da Areia
Publicado em 1937, o romance de Jorge Amado acompanha o cotidiano de um grupo de meninos nas ruas de Salvador, Bahia. Abandonados, eles vivem à margem da sociedade e lutam pela sobrevivência, recorrendo a roubos e sonhando com um futuro melhor. A obra explora as contradições de uma infância marcada pela violência e o abandono.
ABL repudia nova tentativa de censura a livros em nota
Nesta quinta, 3, a Academia Brasileira de Letras (ABL) divulgou uma nota de repúdio assinada por Merval Pereira, presidente da instituição.
"A Academia Brasileira de Letras vem mais uma vez se posicionar contra a tentativa de censura a livros, como acontece agora em Santa Catarina. Escrito em 1937, o livro Capitães de Areia vem sendo admirado desde então. O acadêmico Jorge Amado, um dos nossos maiores escritores, reconhecido internacionalmente, ser discriminado por suposta influência política comunista, a essa altura do século 21, chega a ser patético. Até porque Jorge Amado renegou o comunismo em 1956", diz a nota.
Militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Jorge Amado foi deputado federal pelo partido em 1946. Seu mandato foi cassado no ano seguinte, quando o governo colocou o PCB na ilegalidade. Em 1956, se desligou do partido após as denúncias dos crimes de Stalin. O escritor baiano foi eleito imortal da ABL em 1961. Ele morreu em 2001, aos 88 anos.
Tentativa de censura a livros não é novidade
No Brasil, tentativas de proibição ou boicote a obras literárias têm sido cada vez mais frequentes, geralmente incentivadas por políticos ligados aos partidos de direita - como é o caso do PL de Lemoine, também partido do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Em novembro de 2023, por exemplo, o governo de Santa Catarina ordenou que nove livros fossem retirados de escolas públicas - todos eles títulos estrangeiros, em sua maioria obras de suspense e terror. Antes mesmo, em 2020, o governo de Rondônia empenhou uma tentativa de recolher diversos clássicos da literatura brasileira de escolas, com a alegação de "conteúdos inadequados às crianças e adolescentes", mas desistiu do procedimento.
Em março do ano passado, o livro O Avesso da Pele, de Jeferson Tenório, vencedor do Prêmio Jabuti de melhor romance, levantou discussões nas redes sociais após ter sido criticado pela diretora de uma escola estadual em Santa Cruz do Sul, no Rio Grande do Sul. Ela condenou o que considera "vocabulários de tão baixo nível" presentes no livro, questionando a decisão do governo federal de incluir tal material no Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) para alunos do Ensino Médio. O título aborda questões como racismo estrutural, violência policial e deficiências do sistema de ensino.
Na mesma semana, a Secretaria de Estado da Educação do Paraná emitiu um ofício determinando que o livro fosse recolhido de escolas em Curitiba. "Há um recrudescimento de um discurso conservador, uma visão que se recusa a encarar as questões cruciais da sociedade", afirmou Tenório ao Estadão na época.
Vários outros títulos sofreram tentativas de censura na última década, seja por iniciativa do poder público ou por manifestações pontuais, partindo de pais ou professores.
São casos que mobilizaram debates nas redes sociais e na mídia. Exemplo emblemático aconteceu em 2019, na Bienal do Livro do Rio de Janeiro, quando o então prefeito Marcelo Crivella determinou que uma história em quadrinhos fosse retirada do evento por conter uma cena de beijo gay. Na ocasião, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a decisão tomada pelo Tribunal do Rio a pedido de Crivella.